O TROFÉU BRASIL DE NATAÇÃO E A CONCEPÇÃO DE VASCO
Entre os próximos dias 09 e 12 de Dezembro, o Parque Aquático do Club de Regatas Vasco da Gama receberá o Campeonato Brasileiro Absoluto de Natação (Troféu Brasil), promovido pela Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA). O evento marca o retorno das competições nacionais de forma presencial em 2020, reunindo os melhores nadadores do país. Ele também servirá como seletiva para a formação da seleção brasileira para o Campeonato Sul-Americano de Buenos Aires, no próximo ano. A transmissão do Troféu Brasil será realizada pela TV CBDA, que pode ser acessada pelo link: tvcbda.tvnsports.com.br. Diariamente, as eliminatórias ocorrerão às 9h30 e finais às 18h (de Brasília).
A escolha do Parque Aquático do Vasco, além de reafirmar a importância histórica do clube na promoção do desporto, ocorre na esteira do esvaziamento das instalações do Complexo Esportivo do Ibirapuera, na cidade de São Paulo. Desde que assumiu o governo do estado homônimo, em 2017, a gestão Dória vem sucateando e tornando o espaço inutilizável, em contrariedade ao interesse público e com objetivo entregar a área para atores privados (que pretendem, inclusive, destruir a estrutura voltada aos esportes aquáticos). Para tanto, o governador inviabilizou o uso pelo cidadão paulistano e não somente abandonou as políticas de fomento para formação de atletas e realização de eventos, mas passou a cobrar das federações para tais atividades. Nesse sentido, o governo de São Paulo havia cobrado R$ 33 mil da CBDA para realização do Troféu Brasil. O Vasco, por sua vez, cobrou R$ 15 mil da Confederação; um valor referente somente ao custo de uso do espaço, englobando energia elétrica, limpeza, segurança, manutenção, etc. Nesse sentido, o Clube reafirma sua vocação pública de promotor do esporte, em um cenário em que o Estado não cumpre suas obrigações sociais e está sequestrado por interesses mercadológicos.
Nesse contexto, contudo, é preciso compreender a importância histórica do Parque Aquático do Vasco, as ações recentes que procuraram resguardá-lo perante ameaças a sua existência e a filosofia que está por trás da manutenção deste importante espaço. O Vasco, como é de conhecimento geral, foi fundado como um clube de regatas, dedicado à prática do remo. Sendo assim, a vocação para desportes aquáticos sempre estiveram conosco. Os primeiros passos da instituição na natação ocorreram a partir de 1925, com participações em provas de maratona aquática. De início, reafirmando seu potencial voltado à vitória, o cruzmaltino sagrou-se tetracampeão da Travessia da Guanabara. As conquistas passaram às provas de piscina a partir da década de 1950, tendo como ponto central o Parque Aquático de São Januário. A estrutura foi inaugurada em meados de 1953, sendo a maior instalação deste tipo na América do Sul e a terceira maior do mundo; a piscina principal foi baseada no modelo utilizado nos Jogos Olímpicos de Helsinque, em 1952.
As décadas seguintes continuaram a ser de destaque para o Vasco na natação, sobretudo nas categorias de base, na formação de atletas e na promoção do desporto. Contudo, o ponto mais alto seria alcançado com o Projeto Olímpico vascaíno, na década de 1990, capitaneado pelo presidente Eurico Miranda. Diversos atletas conquistaram medalhas em Mundiais, Jogos Pan-Americanos e Olimpíadas. O cruzmaltino, inclusive, foi tricampeão do mesmo Troféu Brasil entre os anos de 1990 e 2001. Além disso, o Parque Aquático do Vasco foi sede do da Copa do Mundo de Natação, em 1998, e de diversos outros eventos nacionais e internacionais.
Apesar de sua relevância social e do histórico de conquistas, os esportes olímpicos do Vasco foram deixados de lado durante os anos de 2008 e 2014. Produto de uma visão de mundo tacanha, a administração do MUV contrariou as raízes históricas da instituição e trabalhou para reduzi-la a uma espécie de “Vasco Futebol Clube”. Nesse sentido, houve o abandono de diversas práticas esportivas, negligência com possibilidade de angariar recursos através de leis de incentivo ao esporte e a destruição do patrimônio do clube. No que diz respeito ao Parque Aquático de São Januário, as instalações foram completamente abandonadas, quase destruídas: não havia manutenção, piscinas sem água e expostas a depreciação causada pelo clima, e com o espaço funcionando, literalmente, como depósito de lixo.
Felizmente, a partir de 2015, com o retorno do presidente Eurico Miranda ao comando do clube, os esportes olímpicos foram retomados. O Parque Aquático do Vasco foi revitalizado, por intermédio de uma parceria com a Confederação Brasileira de Clubes, sendo reinaugurado em 2017 e passando a estar disponível para os atletas e paratletas cruzmaltinos. Contudo, a recuperação do espaço não foi fruto do acaso, mas produto de uma filosofia sobre o que deve ser o Vasco:
a) A visão de que o clube tem como missão incentivar diferentes modalidades do desporto e formar atletas;
b) O dever de promover a inclusão social e a cidadania através do esporte;
c) Construir e manter espaços que contribuam para formação de torcedores e atletas amadores identificados com a instituição, por intermédio da sociabilidade estabelecida nos espaços do clube;
d) A valorização do patrimônio do Vasco.
A realização do Troféu Brasil de Natação no Parque Aquático do Vasco não é mera coincidência. Ela é fruto de uma concepção de Vasco e serve como um ponto de reafirmação do compromisso histórico da instituição. Tendo superado ataques de setores internos, que se diziam vascaínos, a promoção esportes olímpicos e da cidadania continuam como pontos norteadores da nau vascaína.
RAFAEL DE PAULA
Historiador
Sócio Geral do Vasco