Difícil decisão do Conselho Deliberativo do Vasco naquele início de abril, em 1924.
O clube sairá da AMEA ou não?
O presidente José Augusto Prestes quer defender os atletas do Vasco, mas isso está fora das leis da nova Liga, fora daquilo que é aceitável pelos clubes da elite carioca, não há apoio prévio da imprensa na empreitada e isso fará o campeão de 1923 ficar fora da festa, podendo sofrer inúmeros prejuízos. Um clube que esteve para falir nos seus primeiros anos de vida, poderia sucumbir de vez. Teria de contar apenas com sua torcida, contra tudo e todos fora isso.
Nas ruas o povo pobre, os imigrantes portugueses, os que lutam nas arquibancadas pelo clube (da maneira que fosse necessário) mostram-se revoltados, mas são engolidos pelo noticiário da imprensa escrita. Sua voz será ignorada, silenciada, até mesmo ridicularizada.
Alguns no Conselho Deliberativo tentam argumentar sobre o preconceito, mas é convidado à reunião um outsider, que o clube pensa em no futuro pagar para tomar decisões à base do pragmatismo, diante da tibieza do presidente Prestes, que declarou dias antes à imprensa seu entendimrento em favor dos atletas, os quais se pretende excluir, mas teme represálias do sistema.
As ponderações do Consultor Extraordinário Orientador (CEO) evidenciam em gráficos apresentados numa cartolina branca e letras das cores roxa e amarela as vantagens de o Vasco permanecer na Liga. Abrir mão do dinheiro das rendas dos grandes jogos, de estar na elite, ter de pagar sabe-se lá quanto ao Fluminense, dono do maior estádio do Rio, para alugá-lo, e ainda correr o risco de ouvir um “não” tricolor, sem apoio prévio da imprensa, com o histórico recente de jornais que perseguiam o clube desde o ano anterior, elaborando matérias nas quais se afirmava que o Vasco perderia os pontos das vitórias diante de Botafogo e Flamengo em 1923, por incluir atletas fora dos padrões da Liga antecessora. Os argumentos são robustos.
Prestes se arqueia na cadeira, enquanto a grande maioria aplaude a apresentação do CEO. “Falta bom senso ao Vasco”, diz um. “Vamos ficar brigando contra tudo e todos?”, diz outro. “Danem-se os atletas. Trocamos 12 por outros 12.”, afirma um mais exaltado. “Tanta briga, tanta briga. Será que só o Vasco está certo e o resto errado?”. “Daqui a 100 anos ninguém vai lembrar disso”, encerrou um prócer, da época, qualquer.
O Vasco, então, decide ceder às pressões da AMEA, elimina os 12 “problemas”, mas o desfecho tem o douro da pílula, em palavras e frases concatenadas cuidadosamente por colunistas de jornais da época, que procuram amainar o sentimento do povo vascaíno. Afirmam ter sido acordado com o Fluminense o pagamento de metade do aluguel nos jogos em que o clube for mandante, tanto em 1924 como no ano seguinte, pontuam ter sido liberado o comércio de bolinhos de bacalhau no estádio das Laranjeiras, em dias de jogos, exploradas as vendas por comerciantes credenciados pelo Vasco e, o mais importante dos ganhos: torna-se desnecessário ao Vasco ter uma praça de esportes, um estádio, adequado às normas da AMEA.
Uma vez aquinhoado com tantas benesses o Vasco faz parte da Liga dali por diante, seguindo suas normas, seus condutores, adaptando-se ao sistema, com aplausos da imprensa em geral, que considera o clube da Rua Moraes e Silva mais simpático e um bom coadjuvante, apesar de alguns vascaínos serem menos cordatos às normas impostas. Estes e seus descendentes, entretanto, serão (felizmente na visão midiática) eterna minoria.
Sérgio Frias
PS: Evidentemente que o dito acima é uma ficção. A história mostrou qual foi a conduta do Vasco à época e suas consequências para o futebol brasileiro, bem como para o engrandecimento do clube.
Excelente texto! 👏🏽👏🏽👏🏽👏🏽