O jornal “O Globo” destacava na sua edição de sexta-feira, dia 14/06/1957, data na qual se decidiria o Torneio de Paris, o sensacional prélio, marcado para as 20:45 pelo horário local, entre Real Madrid (Bicampeão europeu 1956/57) e Vasco (Campeão Carioca de 1956).
Os cruzmaltinos se credenciaram para a decisão, após vencer o time da casa e organizador do torneio, Racing de Paris (que o fez em comemoração ao seu 25º aniversário), por 3 x 1, mostrando franca superioridade sobre a equipe francesa na partida.
A equipe brasileira abriu o placar com Livinho aos 20 minutos da etapa inicial e ampliou o escore com Pinga, num forte petardo aos 12 do segundo tempo. Nove minutos depois, Vavá, em jogada de grande categoria passou a pelota por debaixo das pernas de um adversário e marcou o terceiro. Sonat descontou para o time da casa a quatro minutos do fim.
Enquanto isso, o Real Madrid arrasou por 5 x 0 o Rot-Weiss Essen, campeão alemão de 1955, quarto participante do torneio, sem Di Stefano, seu principal astro.
O Vasco enfrentaria aquele que era considerado na Europa como o maior time do mundo. O Real Madrid, de fato, parecia uma máquina de jogar futebol no Velho Mundo. Conquistaria entre 1956 e 1960, o pentacampeonato europeu de clubes (atual Champions League).
O plantel madrilenho contava com o ótimo goleiro Alonso, mas era seu ataque – formado pelo francês Kopa, junto aos argentinos Di Stefano e Rial, além do extrema esquerdo espanhol Gento – a grande sensação da Europa.
O Vasco tinha Carlos Alberto Cavalheiro no gol, Orlando Peçanha na zaga, o craque Valter Marciano, o impetuoso extrema pela direita, Sabará, o artilheiro Vavá e o ponteiro artilheiro Pinga, ex-meia da Portuguesa de Desportos, adaptado à nova posição, tendo marcado 10 gols no Campeonato Carioca no ano anterior, assim como Livinho, que completava o quarteto ofensivo cruzmaltino.
A dupla Valter Marciano (14) e Vavá (13) fora responsável pela marcação de 27 gols no Carioca de 1956, vencido pelo Vasco por antecipação, na penúltima rodada, quebrando a série de títulos do tradicional rival, Flamengo, que sonhara em vão com o tetra. Seria ela capaz de brilhar contra o maior esquadrão do mundo, segundo os europeus?
Se na preliminar o Racing passou pelos alemães do Rot Weiss com um placar raro, 7 x 5, obtendo o 3º lugar do torneio, na decisão esperava-se mais uma atuação de gala do Real em Paris.
Começa a partida e os espanhóis abrem o marcador, como esperado entre a maioria dos presentes, através de Di Stefano.
A ilusão de uma vitória fácil foi desfeita pelo volume de jogo e toque de bola do Vasco. Aos 21, quando Valter Marciano empatou a peleja, o domínio cruzmaltino já era flagrante. Três minutos depois Vavá obrigou Alonso a praticar excelente defesa. Mais dois minutos se passaram e o mesmo Vavá atirou por cima da trave, perdendo grande oportunidade, mas aos 33 não houve jeito. O artilheiro vascaíno acertou o alvo e virou o placar.
O ritmo dos brasileiros caiu no final da primeira etapa, mas o adversário não conseguiu chegar ao empate, embora Di Stefano tenha perdido boa oportunidade perto do fim daquele período.
Na volta do intervalo, tensão em campo. Mateos empatou a partida, depois de receber bom passe de Kopa, aos 7 minutos. Aos nove sofreu falta dura próximo a área, sem maiores consequências para o Vasco após a cobrança, mas logo depois Carlos Alberto, arqueiro vascaíno, recebeu carga desnecessária em lance no qual era senhor absoluto da jogada.
O clima quente teve como ápice um soco de Ortunho, substituto de Coronel no time vascaíno naquela competição, em Mateos. Confusão geral em campo. Vários atletas das duas equipes brigaram. No fim do tumulto, que paralisou a peleja por 10 minutos, Ortunho foi expulso pelo árbitro francês, responsável pela condução do espetáculo.
O Vasco, que já seguira sem Coronel para a Europa, não tinha também a presença de Paulinho de Almeida e Bellini, ambos servindo a Seleção Brasileira em amistosos contra Portugal, no Rio e em São Paulo, a 11 e 16/06 (2 x 1 e 3 x 0).
Mateos abandonou o campo e o Real Madrid queria substituí-lo por Santeba, mas os brasileiros contestaram. Segundo o regulamento da competição só poderiam ser feitas duas alterações por equipe, mais o goleiro, e o time espanhol já as processara. Com isso a partida seguiu com dez para cada lado.
O Vasco partiu para cima do adversário e após grande jogada de Valter Marciano – que passou a bola por entre as pernas do zagueiro madrilenho Lesmes – Livinho marcou aos 28 minutos o gol de desempate.
Mais do que depressa Mateos resolveu voltar a campo, sendo autorizado pelo árbitro. O Real Madrid não podia perder e agora tinha um jogador a mais no gramado para em 17 minutos obter ao menos o gol de empate.
A equipe espanhola buscou a igualdade, mas foi surpreendida com o quarto tento cruzmaltino assinalado por Valter* aos 38, após receber ótimo centro de Pinga.
A dois minutos do fim, Kopa descontou para o Real, que buscou o empate até o último instante (que levaria o jogo a uma prorrogação), mas sem sucesso.
Após o apito final do árbitro, a torcida francesa ovacionou as duas equipes. O Vasco ergueu a taça de campeão e as versões relacionadas à confusão ocorrida na segunda etapa eram diametralmente opostas na visão de brasileiros e espanhóis.
Enquanto Santiago Bernabeu, presidente do Real, dizia ter sido prejudicada a equipe madrilenha com a contusão de Mateos, fruto do soco desferido por Ortunho, Martim Francisco, técnico do Vasco, culpava a equipe adversária pelo destempero vascaíno em campo, fruto, segundo ele, de agressões sofridas pelos atletas cruzmaltinos, mesmo sem a posse de bola.
A vitória vascaína sobre o bicampeão europeu, obtida com três reservas em campo, e ainda um homem a menos nos últimos 17 minutos de partida, tomou conta dos noticiários no mundo futebolístico e representou a maior disputa entre sul-americanos e europeus da época.
Cerca de um ano depois o Brasil seria Campeão do Mundo, com três atletas vascaínos titulares: Bellini, Orlando e Vavá.
Ficha Técnica:
Data: 14/06/1957
Local: Estádio Parc de Princes – França
Renda: Aproximadamente CR$3.300.000,00
Público: 36.437 espectadores
Gols: Di Stefano (RM) 4, Walter Marciano 21, Vavá 33 do 1º tempo; Mateos (RM) 7, Livinho 28, Walter Marciano 38, Kopa (RM) 43 do 2º tempo.
Vasco da Gama: Carlos Alberto; Dario, Viana, Orlando e Ortunho; Laerte e Válter; Sabará, Livinho, Vavá e Pinga. Técnico: Martim Francisco.
Real Madrid: Alonso, Torres, Marquitos (Santamaria), Lesmes e Munoz; Ruiz e Meteos; Kopa, Di Stéfano, Rial (Marshall) e Gento. Técnico: José Villalonga.
Fontes de Pesquisa: O Globo/Jornal do Brasil/Diário de Notícias
Fotos: Google
*Jornal do Brasil e O Globo noticiaram ter sido de Sabará o quarto tento vascaíno contra o Real Madrid.
O Globo (15/06/1957)
Jornal do Brasil (15/06/1957)
A Noite (15/06/1957)
Reportagem sobre o histórico título Intercontinental conquistado pelo Vasco:
Fonte: NetVasco
Outras vitórias do Vasco no dia 14 de junho:
América 1 x 2 Vasco (Carioca 1942)
Sport Club Juiz de Fora-MG 0 x 7 Vasco (Amistoso 1944)
Vasco 2 x 1 Fluminense (Torneio Rivadávia Correa Meyer 1953)
Atlético Madrid-ESP 4 x 5 Vasco (Amistoso 1959)
Combinado IFK/AIK-SUE 1 x 4 Vasco (Amistoso 1961)
Vasco 1 x 0 Bangu (Amistoso 1964)
Vasco 2 x 0 Portuguesa (Carioca 1979)
Vasco 3 x 1 Seleção do Kuwait (Amistoso 1980)
Vasco 2 x 1 Porto-POR (Amistoso 1981)
Moto Club 1 x 2 Vasco (Amistoso 1983)
South Melbourne-AUS 0 x 1 Vasco (Amistoso 1985)
Vasco 3 x 0 Benfica-POR (TAP Cup 1987*)
*Partida disputada em New Jersey, EUA.